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Rua XV de Novembro

Publicado em 1 de setembro de 2023

Escravidão e liberdade nos anúncios de jornal

A atual Rua XV de Novembro já foi Rua das Flores e Rua da Imperatriz . Ali, no século XIX, ficava o jornal O Dezenove de Dezembro. Fundado em 1854, logo após a emancipação da Província do Paraná, o jornal divulgava as medidas do governo provincial, mas também publicava notícias e anúncios variados. Dentre os anúncios, os de venda e fuga de pessoas escravizadas podem evidenciar vários aspectos relacionados à escravidão.

Fontes Históricas

I – Anúncio de venda de escravizados

O Dezenove de Dezembro. 1º de abril de 1854. Este anúncio, publicado no primeiro número do jornal, além de demonstrar que as pessoas escravizadas eram compradas e vendidas, evidencia que a prática da escravidão ilegal, realizada no Brasil escravista, ocorreu também no Paraná. Esse rapaz que estava sendo vendido era africano – o que designa o termo “de nação”. Pela idade declarada, pode-se saber que ele nasceu por volta de 1830. Como a lei que proibiu que africanos fossem introduzidos no Brasil como escravos vigorou a partir de 1831, para ter sido trazido legalmente como escravo no país ele deveria ter chegado com idade máxima de 1 ano. Como isso é pouquíssimo provável, esse trabalhador de engenhos de mate foi certamente um africano ilegalmente escravizado, como outros centenas de milhares de africanos criminosamente escravizados com a conivência do Estado Imperial brasileiro.

II – Anúncios de Fuga

Os anúncios de fuga eram muito detalhados, pois visavam fazer com que a pessoa procurada fosse reconhecida. Eles dizem sobre as experiências de escravos: os castigos – evidenciados pelas marcas – bem como aptidões, ofícios e estratégias para se livrarem de um domínio ao qual se contrapunham.

O Dezenove de Dezembro. 5 de fevereiro de 1881.

O Dezenove de Dezembro, 23 de setembro de 1854.

O Dezenove de Dezembro. 17 de dezembro de 1879.

III – Ex-escravizados: sujeitos nos anúncios

Barnabé foi um trabalhador escravizado, e depois liberto, que viveu em Curitiba na segunda metade do século XIX e primeira do XX. Exercia o ofício de sapateiro. Seu senhor, um padre em São José dos Pinhais (João Batista Ferreira Bello), de quem Barnabé adotava o sobrenome, explorava indiretamente seu serviço, recebendo dele uma determinada quantia em dinheiro, que o sapateiro obtinha exercendo sua profissão. Barnabé tinha uma boa freguesia e vivia com muita autonomia em Curitiba. Por volta de 1880, o escravizado passou a recusar a entrega do dinheiro ao padre e este tentou vendê-lo para um fazendeiro produtor de café em Campinas, onde as condições de trabalho eram bem diferentes – e piores – do que as que o sapateiro experimentava em Curitiba. O escravizado resistiu a essa venda. Chegou a entrar com um processo judicial. Em 1885, quando já estava liberto, certamente em razão dos conflitos com seu ex-senhor, decidiu mudar de nome e fez esse anúncio no jornal:

O Dezenove de Dezembro, 18 de março de 1885, p. 3. O processo judicial movido por Barnabé contra seu senhor encontra-se no Arquivo Público do Paraná. Ação de Liberdade, Barnabé Ferreira Belo, 1880. BR PRAPPR PB045 PI7718.294.

Quer saber mais?

Você pode acessar as fontes que consultamos para elaborar esse conteúdo, que listamos a seguir.

Sobre os anúncios envolvendo pessoas escravizadas:

FREYRE, Gilberto. O escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX. Recife: Imprensa Universitária, 1963.

CÂMARA. Juliana de Cássia. Escravos em fuga: histórias de escravidão e liberdade no Paraná provincial (1854-1888). Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação História). Curitiba, Universidade Federal do Paraná, 2013. http://www.humanas.ufpr.br/portal/historia/files/2013/12/TCC-JULIANA-CAMARA-FINAL.pdf (16/01/2020).

Sobre a trajetória de Barnabé Francisco Vaz:

MENDONÇA, Joseli M. N. Negros em Curitiba: experiências na escravidão. In: BARACHO, Maria Luiza.(org.) Presença Negra em Curitiba. Curitiba: Fundação Cultural, 2020. Disponível em http://www.fundacaoculturaldecuritiba.com.br/pub/file/pp_livro_presencanegra_web%20%281%29.pdf

SILVA, Noemi S. Entre letras e lutas: educação e associativismo no Paraná. In: MENDONÇA, Joseli M N., TEIXEIRA, Luana, MAMIGONIAN, Beatriz G. Pós-Abolição no Sul do Brasil – associativismo e trajetórias negras. Salvador: E. Sagga, 2020. Disponível em https://bgmamigo.paginas.ufsc.br/files/2020/06/MENDON%C3%87A-TEIXEIRA-MAMIGONIAN-orgs-2020-P%C3%B3s-Aboli%C3%A7%C3%A3o-no-Sul-do-Brasil.pdf (07/09/2023).

Como fazer a referência deste conteúdo: UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ. PROJETO DE EXTENSÃO AFROCURITIBA. https://afrocuritiba.ufpr.br/mapa/ . Acesso em [data do acesso].


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