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Publicado em 14 de setembro de 2023

Sociedade Protetora dos Operários – mutualismo, sociabilidade e militância

Smart Park, estacionamento da Prefeitura no bairro São Francisco, completa 1 ano de existência. – Curitiba, 27/06/2022 – Foto: Daniel Castellano / SMCS. https://transito.curitiba.pr.gov.br/noticias/prefeitura/smartpark-sao-francisco-completa-um-ano/64443 (02/10/2023).

Nesse espaço, onde atualmente se encontra um estacionamento administrado pela Prefeitura Municipal de Curitiba, desde o final do século XIX ficava a sede da Sociedade Protetora dos Operários. Fundada em 1883, funcionou inicialmente na casa de um dos sócios fundadores – João Batista Gomes de Sá – à Rua do Mato Grosso (atual Comendador Araújo).

A “Operários”, como ficou mais conhecida, foi a primeira agremiação de trabalhadores de Curitiba, fundada em 1883, destinada a ser um espaço de convivência, sociabilidade e mobilização para operários da cidade. Manteve-se em funcionamento até o início dos anos 2000, mas sua atuação foi mais intensa na primeira metade do século XX. Dentre seus objetivos, estava a arrecadação de fundos para auxiliar os sócios em caso de doenças e morte, o que a caracterizava como uma agremiação mutualista. Mas também procurava responder a outras demandas, relacionadas ao lazer, à mobilização operária e a formação intelectual dos sócios, para o que contava com uma biblioteca e uma escola noturna. Com uma identidade fortemente vinculada ao trabalho, essa sociedade teve um caráter multiétnico. Nela trabalhadores negros conviviam com sócios de várias nacionalidades – alemães, poloneses, italianos. Os trabalhadores negros, entretanto, tiveram um papel central na instituição. Um dos próprios fundadores, o mestre de obras Benedito Marques, era um homem negro, em relação ao qual se faz menção ao fato de ter vivido e experiência da escravização.

Benedito Marques dos Santos. Jornal do Estado, 29/01/1992 – Biblioteca Pública do Paraná. Foto sem informação de autoria.

Outros trabalhadores negros tiveram importante participação na agremiação, entre eles João Batista Gomes de Sá, a quem já nos referimos, Hilário Munhoz de Souza Ribas e Vicente Moreira de Freitas. No caso de Moreira de Freitas, a vinculação à associação foi marcante não apenas em sua experiência pessoal, mas também de sua família: pelo menos dois de seus filhos – Palmyra e Mário Moreira de Freitas – foram atuantes na instituição nos anos 1910.

FONTES

Estatutos

Várias informações da Sociedade Protetora dos Operários, como de outras do gênero, podem ser obtidas por meio de seus estatutos, que constituem importantes fontes para o estudo de sua história. A imagem abaixo mostra quais os objetivos definidos pela agremiação e os critérios de inclusão, direitos e deveres dos sócios.

Estatuto da Sociedade Protetora dos Operários, 1883. Arquivo Público do Paraná, AP693, pp. 82-87. Foto de Pâmela Fabris.

Fotografias

Também as imagens da sociedade podem constituir fontes para estudo. Nas imagens a seguir, uma das coisas que se pode observar é que os grupos fotografados era composto unicamente por homens. O que mais se pode saber dessa agremiação por meio do registro de suas imagens?

Sócios em frente à sede da Sociedade Protetora dos Operários – Jornal do Estado, 29/01/1992 – Biblioteca Pública do Paraná, Seção Paranaense. Sem informação de autoria.

Nessa fotografia, é possível observar que há homens negros e que eles não ocupam o primeiro plano da foto. Um deles parece até esgueirar-se para se tornar visível à lente da câmera. Será que sua posição na imagem sugere alguma hierarquia racialmente constituída no âmbito do grupo?

Sócios em frente à sede da Sociedade Protetora dos Operários – foto sem informação de data e de autoria. Acervo Casa da Memória da Fundação Cultural de Curitiba.

No ano de 1917 os trabalhadores urbanos realizaram uma greve geral que paralisou várias cidades do país, entre elas, Curitiba. A imagem abaixo mostra o papel importante da Sociedade Protetora dos Operários nessa mobilização. Em frente à sua sede muitos trabalhadores reunidos durante o movimento grevista.

Fotografia sem informação de autoria. Acervo da Casa da Memória – Coleção Júlia Wanderley. Fundação Cultural de Curitiba.

Memórias

A Sociedade Protetora dos Operários era também um local de lazer e sociabilidades. Os bailes realizados anualmente na data de sua fundação – 28 de janeiro – compuseram as memórias de membros das famílias dos associados, como as da Sra. Índia Maria Freitas Fabre, neta de Vicente Moreira de Freitas, um dos primeiros associados da “Operários” e filha de Mário Moreira de Freitas, que foi orador da sociedade. No fragmento de uma entrevista que concedeu pouco antes de falecer, Dona Índia nos falou de quando frequentava os bailes que a Sociedade realizava nas datas de 28 de janeiro, nos aniversários de sua fundação:

Lembro, nossa você não pode imaginar como é que era o baile [emoção, entusiamo]…Ah, é o seguinte… eles faziam aqueles… aquela festa… era uma festa! Você foi, né [dirigindo-se a Nei, seu sobrinho, presente na entrevista], você lembra do baile do Operário né? Lembra? Faziam aquelas mesas todas decoradas assim, sabe? Em volta do salão, era uma maravilha de tudo que você pode imaginar… Tinha o buffet, que a gente fala, né. Depois do buffet que vinha o baile. Era uma maravilha!

[…]

… tinha banda! [animada] Mas não era essa banda que tem agora. Era banda, música assim… músicas daquela época assim… era muito bonita!

[…]

Era… era lotado.

A família dos sócios, iam toda a família né. Era…

[…]

O traje não era a rigor, mas era um traje que tinha que ir bem vestido, sabe? Se não fosse bem vestido tu não entrava.  Era bem vestido, mas não era a rigor não, entende? Bem clássico sabe, era bonito.

[…]

… dentro da sociedade, eu lembro, nossa era uma maravilha, era muito linda. Que pena que não tem fotografia, muito lindo lá dentro, muito linda a sociedade e agora deve ser eu não sei...

[intervenção de entrevistadora]: Agora ela foi quase demolida praticamente. Não existe mais nada quase.

Lá?! [espantada] . IF – Ai que pena. [emoção]…

FABRE, India Freitas. Entrevista a Joseli Mendonça, Pâmela Fabris, Nei Moreira de Freitas e Carolina Moiséis. Íntegra em: AfroSul. Afrodescendentes na Região Sul. Biografias, trajetórias associativas e familiares. 2020. https://afrosul.com.br/india-maria-freitas-fabre/

As memórias dos bailes do 28 de janeiro na Sociedade Protetora dos Operários estão presentes em outro ramo da família de Vicente Moreira de Freitas. A fotografia abaixo, guardada em álbum de família, mostra Moacir Brito, neto de Vicente, em um desses eventos comemorativos.

Foto sem informação de autoria e de sem data [provavelmente dos anos 1960]. Acervo particular de Maurício Brito.

Para saber mais sobre a Sociedade Protetora dos Operários, você pode consultar:

FABRiS, Pâmela B. Sociedade Protetora dos Operários (Curitiba) – Verbetes. Dicionário AfroSul. https://afrosul.com.br/sociedadeproteroraoperarios/ .

MENDONÇA, J. M. N. ; FABRIS, P. B. . Os trabalhadores têm côr: militância operária na Curitiba do Pós-Abolição. In: RIBEIRO, Luiz Carlos; GRUNER, Clóvis. (orgs.). Utopias e experiências operárias – ecos da greve de 1917 . São Paulo: Intermeios, 2019, p. 75-92.

MENDONÇA, J. M. N., FABRIS, P. B. Freitas e Brito: trajetória de uma família negra na Curitiba do final do século XIX e início do XX. MENDONÇA, J. M. N.; TEIXEIRA,L e MAMIGONIAN, Beatriz G. Pós-Abolição no Sul do Brasil: associativismo e trajetórias negras. Salvador: Sagga, 2020. https://afrosul.com.br/pos-abolicao-no-sul-do-brasil/ (02/10/2023).

MOISES, Carolina Marchesin. Hilário Munhoz de Souza Ribas (verbete). Pessoas – Dicionário Afrodescendentes na Região Sul https://afrosul.com.br/hilario-munhoz-de-souza-ribas/

RIBEIRO, Luiz Carlos. Memória, trabalho e resistência em Curitiba (1890-1920). 263f. Dissertação (Mestrado em História – USP), São Paulo, 1985.

VASCO, Edimere. S.A cultura do trabalho na Curitiba de 1890 a 1920. 122 f. Dissertação (Mestrado em História) – Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2006 FONSECA, Ricardo Marcelo e GALEB, Maurício. A Greve Geral de 1917 em Curitiba – Reconstituição da Memória Operária. Curitiba: Factum, 2017.

Como fazer a referência deste conteúdo: UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ. PROJETO DE EXTENSÃO AFROCURITIBA. https://afrocuritiba.ufpr.br/mapa/ . Acesso em [data do acesso].

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